Por que os diplomas estão perdendo valor?

março 28, 2017 | por Luciano Bitencourt

Ken Robinson esteve por duas vezes em eventos do TED (Technology, Entertainment, Design). Professor e consultor de governos europeus, autor de livros sobre educação, Robinson falou em 2006 sobre a escola como um ambiente que inibe a criatividade (em inglês). Quatro anos depois, argumentou sobre a necessidade de mudança radical nos processos de formação, das escolas padronizadas para a aprendizagem personalizada (em inglês). As reflexões são bem similares e compõem quase que uma só narrativa.

O sistema educacional, diz Ken Robinson, obedece a critérios idênticos no mundo inteiro para atender ainda a processos lineares de produção. As escolas dão mais importância, por exemplo, a assuntos relacionados ao trabalho e valorizam um tipo de inteligência que privilegia estágios subsequentes de “evolução” intelectual. Em síntese, essa é a razão pela qual os diplomas estão perdendo valor.

Os estágios que esses documentos chancelam estão cada vez mais curtos e já não fornecem respostas aos desafios que precisamos superar.

Duas frases dele expressam bem isso:

“A educação, de alguma maneira, desloca muitas pessoas de seus talentos natos” (2006).

“Comunidades humanas dependem de uma diversidade de talentos, não de um conceito de habilidade” (2010).

Robinson propõe que o sistema educacional assuma um processo orgânico de formação, um processo baseado na criação de condições para que o desenvolvimento comece a prosperar em função dos talentos. Não se trata de prever resultados, mas de cultivar ambientes e oportunidades. E um dos principais empecilhos é a “tirania do senso comum”, que nos diz como as coisas sempre foram e como devem continuar sendo.

A inteligência é diversificada, dinâmica e distinta na versão de Ken Robinson. Quer dizer: sem interação entre diferentes saberes e formas de ver as coisas não há como florescer ideias novas. A proposta se situa no âmbito da aprendizagem personalizada, com base nas descobertas a respeito do que cada um gosta de fazer, com programas individualizados. É uma mudança e tanto. Talvez utópica, mas inspiradora.

Talento como valor na educação corporativa

Por trás da maior parte de programas em educação corporativa estão modelos padronizados de formação. Ao contrário da educação formal, os resultados em educação corporativa precisam ser rápidos e tangíveis para que o investimento valha a pena. Pensa-se, quase sempre, na instrução para tarefas específicas como forma de qualificar postos de trabalho. Mas e os valores? E a visão de futuro? E a missão assumida pelas organizações?

Há empresas que entendem que formas de convivência impactam nos resultados; se preocupam com o bem estar na cadeia produtiva, não só dentro dos próprios quadros, como forma de cultivar boas relações de produção; fomentam o desenvolvimento intelectual mas valorizam o espírito, as energias e as paixões de quem é do quadro. E o fazem de muitas maneiras.

Sem as amarras características da educação formal (diretrizes e normas, modelos e estruturas rígidas), a educação corporativa abre um campo fértil para se pensar na aprendizagem orientada por programas que permitam configurações de espaço e tempo “customizadas” e pela associação de atividades com propósitos maiores do que exclusivamente qualificar postos de trabalho. É um daqueles investimentos cujo retorno não é imediato, mas sedimenta valores.

Como diz Ken Robinson, a crise de recursos humanos não tem como ser tratada do mesmo modo que a de recursos naturais porque não se sabe exatamente onde estão os recursos. Mas se pode mapear talentos e investir em ambientes e oportunidades para que se desenvolvam. E esse deve ser um processo contínuo, essencial para manter as empresas e seus times preparados para as mudanças ao longo do caminho, fazer o alinhamento da estratégia às necessidades das organizações, e também dos objetivos e metas às competências necessárias para planejá-los e alcançá-los.

Luciano Bitencourt

Formado em Jornalismo, é professor universitário daquela graduação há mais de 15 anos. Já atuou como repórter e participou de diversos projetos na área. É sócio-proprietário da Akademis.